King Kong – Peter Jackson’s Production Diaries

[rating:5]

Se não pode vencê-los, junte-se a eles. O velho ditado popular foi a arma utilizada pelo cineasta Peter Jackson para evitar que fãs bisbilhoteiros vazassem informações na Internet sobre as gravações da trilogia “O Senhor dos Anéis”. Periodicamente, editores dos principais sites de fofocas eram convidados para olhar os bastidores da produção. Este contato íntimo criou um elo afetivo entre fãs e equipe técnica, de forma que os principais segredos foram mantidos em sigilo. No filme seguinte, “King Kong” (2005), Jackson foi mais longe, criando um site gigantesco e alimentando-o com vídeos diários que cobriam detalhadamente o andamento das gravações. Este material foi reunido em uma caixa luxuosa de dois DVDs, intitulada “King Kong – Peter Jackson’s Production Diaries” (EUA/Nova Zelândia, 2005).

Lançado nos Estados Unidos e em diversos países europeus, em edição limitada, o box ganhou as lojas um dia antes de o filme estrear mundialmente, em dezembro de 2005. Foi um golpe de marketing genial, já que dava ao público a chance de mergulhar profundamente no universo do longa-metragem. Apesar de o material não ser inédito, ele tinha qualidade de vídeo (widescreen 1.78:1 anamórfico) e áudio (Dolby Digital 2.0) bem superior aos arquivos disponibilizados na Internet. Vinha, ainda, numa embalagem luxuosa, que incluía mini-pôsteres com desenhos da produção, um livro de 52 páginas coloridas repleto de fotos e informações, e um certificado de autenticidade assinado pelo próprio diretor. OK, tudo isso fez parte de uma jogada de marketing esperta, mas o conteúdo dos vídeo-diários – 216 minutos no total – providencia uma chance inédita, para estudiosos de cinema, de acompanhar o andamento de uma grande produção, passo a passo, observando todos os detalhes de como se faz um filme e cobrindo todos os 131 dias de trabalho. É divertido e instrutivo.

Este é o maior mérito dos “Production Diaries”. Cinéfilos em geral sabem que informações detalhadas a respeito do cotidiano de uma produção cinematográfica é material difícil de encontrar, ainda mais no nível assombroso de detalhes que o DVD duplo consegue empacotar. As quase quatro horas de material estão divididas por dia de trabalho, e a duração de cada featurette é variável – há a opção “play all”, em que os vídeos são exibidos continuamente, como um grande documentário. O diretor responsável pelo making of, Michael Pellerin, foi esperto o suficiente para dividir os diários em temas, de forma que cada um dos 54 vídeos enfoca um aspecto específico da produção. Alguns deles são bobagens que não passam de mera curiosidade inútil. Um, por exemplo, mostra Jackson e os atores Jack Black e Adrien Brody ensinando como causar no espectador a ilusão de que estão caminhando dentro de um navio em alto mar (a câmera faz leves movimentos laterais, enquanto os atores caminham como bêbados).

Aquela parte dos diários que focaliza aspectos técnicos da produção – meia dúzia de featurettes sobre a construção do enorme set que imita a Nova York de 1933, inclusive enfocando a criação dos figurinos e a restauração de carros antigos – é muito boa. E há destaques fascinantes. Um dos diários gasta longo tempo explicando o funcionamento das câmeras e lentes usadas na produção. Outro acompanha um dia típico no trabalho de Peter Jackson (impressionante notar quanto tempo um diretor gasta com tarefas que não têm nada a ver com filmar). Um dos mais instrutivos revela o que faz o continuísta de iluminação – assistente do fotógrafo responsável por anotar, meticulosamente, todos os aspectos da fotografia de uma cena (níveis de luz, tipo de câmera, cores, filtros, lentes, etc.). Todos esses dados são jogados em um software e usados pelos diretores de unidades secundárias, que filmam cenas sem os atores principais, com o objetivo de garantir a uniformidade da iluminação em todas as cenas.

Além de acompanhar detalhadamente o cotidiano dos diversos profissionais envolvidos na indústria cinematográfica (motoristas, carpinteiros, cozinheiros, cabeleireiros e maquiadores, operadores de áudio, editores de som e imagem, etc.), “Production Diaries” também inclui uma boa dose de humor. Um dos vídeos mostra, em tom divertido, a investigação empreendida pela produção para identificar o membro da equipe que, usando o apelido de Gandalf, andava publicando imagens não autorizadas na Internet. A piada mais bem elaborada conta com a participação do elenco e até de um vice-presidente da Universal (o estúdio que bancou “King Kong”). Eles confirmam a realização de duas seqüências do filme, enquanto Peter Jackson chega a mostrar páginas do falso roteiro e design de criaturas que o filho de Kong enfrentaria. Caso você estranhe o fato de tais produções jamais terem sido feitas, saiba que tudo não passava de um trote de 1º de abril.

Além da boa qualidade de imagem e áudio, o pacote vem numa embalagem luxuosa de papelão que imita uma velha caixa de madeira. Ele nunca foi lançado no Brasil, mas pode ser encontrado em lojas dos EUA e Europa, com legendas em inglês e espanhol. É importante lembrar, ainda, que a segunda parte dos diários – aquela que cobre a pós-produção, incluindo todo o trabalho de CGI, montagem e edição de som – consta do DVD duplo do filme oficial, que foi lançado no Brasil.

– King Kong – Peter Jackson’s Production Diaries (EUA/Nova Zelândia, 2005)
Direção: Michael Pellerin
Documentário
Duração: 216 minutos

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