Jayme Monjardim

O paulista Jayme Monjardim tem uma extensa folha corrida de serviços prestados à televisão brasileira. Alguns dos momentos mais memoráveis dessa trajetória são a novela “Pantanal” (1991) e a minissérie “A Casa das Sete Mulheres” (2002). Foi durante a produção desta última que ele recebeu o convite, da produtora Rita Buzzar, para assumir a direção de “Olga”. Monjardim aceitou sem pensar duas vezes.

É uma estréia tardia, mas de certa forma o cinema não é um território estranho para o diretor. Quando começou a carreira no setor audiovisual, no final dos anos 1970, Jayme dirigia curtas-metragens. Fez mais de 20 deles antes de enveredar pela publicidade, e daí à TV. Para divulgar “Olga”, ele passou três dias no Recife e concedeu mais de 20 entrevistas. Jayme conversou com o Cine Repórter nos estúdios da TV Globo, em Olinda, e não se esquivou de nenhuma pergunta.

“Olga” é um projeto de Jayme Monjardim?
Não. Coincidentemente, há 20 anos, quando eu estava fazendo curtas-metragens em Pernambuco, li o livro de Fernando Morais e achei que daria um grande filme. Fiz uma pesquisa e descobri que os direitos autorais já haviam sido vendidos. Cheguei a pensar em tentar me oferecer para o projeto, mas eu não era conhecido naquela época. Desisti. Aí, em 2002, a produtora Rita Buzzar me convidou para dirigir o filme. De certa forma, dá para dizer que “Olga” é um sonho de 20 anos.

Rita Buzzar é creditada como produtora e roteirista. Você teve liberdade para mexer no texto e trabalhar de uma maneira mais autoral?
Mexi no texto sim. Acho que o diretor sempre tem que ter essa liberdade de trabalhar no texto final junto com o roteirista. “Olga” foi um trabalho escrito a quatro mãos. Minha visão do filme era mais humana. Eu não queria um filme político. Não queria narrar a história do Luiz Carlos Prestes e nem da tentativa frustrada de golpe; queria contar a história de uma mulher e da grande história de amor que essa mulher viveu. Queria dar ao filme uma visão feminina.

Você é uma pessoa de prestígio na TV. A tua entrada no projeto ajudou a produção a caminhar mais rápido?
Não. “Olga” foi um projeto erguido em tempo recorde. Gastamos seis meses de pré-produção, dez semanas de filmagem e seis meses de finalização. Pouco mais de um ano, que é um tempo muito rápido para cinema.

Não houve problemas de captação de recursos?
Houve. A Rita demorou sete anos para levantar o dinheiro necessário.

E o nome de Jayme Monjardim ajudou a solucionar isso?
Não. Quando recebi o convite, a parceria da Globo Filmes já estava acertada e o dinheiro, todo captado.

Você está estreando no cinema com “Olga”, apesar de ser veterano na TV. Há alguma particularidade em filmar para a tela grande, algo que você normalmente não faria na televisão?
Eu tenho uma visão muito pessoal sobre os meus projetos. Não consigo ver muita diferença na linguagem da TV e do cinema. Se eu estivesse filmando essa história para a TV, teria feito a mesma coisa. Lógico que existem diferenças. No cinema você tem mais tempo, pode dar um acabamento mais esmerado. O som, por exemplo, eu passei três meses finalizando e mixando em Dolby. Jamais teria esse tempo na TV.

O som chama a atenção de quem assiste ao filme. A mixagem foi feita no Brasil?
É 100% nacional. Tenho orgulho de dizer que essa produção é inteiramente nacional. As locações foram todas no Rio de Janeiro e nós não viajamos, a não ser na fase de pesquisa. Há muitos estreantes – o diretor de fotografia, a diretora de arte, eu, a atriz principal. Esse é um grande filme de estreantes.

Coisa rara no Brasil…
É raro, mas para mim foi importante trazer essa pureza dos estreantes. Eu não queria ter uma equipe que trouxesse os vícios do cinema. Essa pureza era necessária para poder trazer uma linguagem que usasse mais os closes, por exemplo. O close para mim é fundamental em “Olga”, porque me ajuda a mostrar mais a alma, o íntimo da mulher. Era isso que eu queria mostrar, o lado humano da história. O pessoal que trabalha com cinema há muito tempo não gosta muito de closes (risos).

Uma coisa muito evidente no filme é a maneira como você explorou os olhos da Camila Morgado. Até que ponto os olhos foram determinantes para que ela fosse escolhida como protagonista?
Quando me propuseram fazer o filme, um dos meus primeiros pedidos foi ter a Camila fazendo Olga. Fui muito enfático nisso. Primeiro pela qualidade dela como atriz; segundo, pela semelhança dela com Olga. Os produtores gostaram da idéia. A gente estava começando a fazer “A Casa das Sete Mulheres”, ela tinha disponibilidade de tempo e ficou interessada. Tudo se completou ali.

Aliás, muita gente do elenco de “A Casa das Sete Mulheres” está em “Olga”. Quanto o filme deve à minissérie?
Eu sou muito fiel aos atores com quem eu trabalho. Não tenho medo de repetir atores. Historicamente, no mundo todo, os diretores sempre escolhem seus atores prediletos e trabalham com eles várias vezes. Cria-se uma cumplicidade, uma confiança. Comigo não é diferente.

Uma curiosidade: o filme sofreu muitos cortes? Porque ele dá essa impressão de ter sido muito cortado…
O primeiro corte do filme estava com 3h10. Eu eliminei aproximadamente uma hora de filme até chegar ao resultado final. Sobraram entre 16 e 20 cenas. Esse material vai estar no DVD. Se der tudo certo, no final de 2005 eu pretendo transformar o filme em uma minissérie de quatro capítulos para exibir na TV Globo. Aí, quero reintegrar todas essas cenas à trama.

A crítica brasileira, especialmente a paulista, tem sido dura com o pessoal de TV que vai fazer cinema. Você vê diferença na linguagem das duas mídias?
Bem, eu comecei fazendo cinema, passei para a TV e voltei para o cinema. Por princípio, essas críticas não se aplicariam a mim (risos). Vou te falar uma coisa: se algum crítico conseguir definir bem o que deve ser exclusivo da TV e o que deve ser do cinema, vai me ajudar muito no meu trabalho. Para mim, o que importa é se a história é bem contada ou mal contada. Se a linguagem de “Olga” é de cinema ou de televisão, eu não sei. É a minha linguagem, ponto final. Contei o filme do meu jeito.

É possível perceber no filme um cuidado muito grande com a parte visual, inclusive no tratamento da cores…
A gente estudou demais esse lado visual do filme. Foi feito um estudo específico sobre cores antes de filmar a primeira cena. Eu queria uma fotografia monocromática, suave, glacial. Queria valorizar a pele dos atores. Se você olhar o rosto da Camila no filme – olhos, boca, nariz – ele é valorizadíssimo. Eu queria uma textura mais européia na fotografia do filme. Queria evitar a luz tradicional do nosso país, que é muito solar, quente. O filme não é solar. É frio. Ele se passa na Alemanha, na URSS e nos interiores do Rio de Janeiro. Olga e Prestes nem saíam de casa! O filme tinha que mostrar esse isolamento de alguma forma e foi por isso que optamos por fazê-lo monocromático.

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