Sem-Floresta, Os

[rating:3]

Animações que apresentam bichos falando são uma verdadeira instituição norte-americana. Walt Disney ergueu todo um império de desenhos animados, criando o pato Donald e o Mickey, a partir desta idéia, que continua que continua em alta. Trata-se de uma das poucas características que não perdeu prestígio depois que os computadores eliminaram lápis e canetas do arsenal dos melhores animadores. “Os Sem-Floresta” (Over the Hedge, EUA, 2006), produção da DreamWorks, pega carona em uma tira de jornal bastante popular nos Estados Unidos para apresentar à criançada uma nova turma de bichos falantes. É um filme simpático, agitado e despretensioso, embora não prime exatamente pela originalidade.

Nos EUA, o lançamento foi aguardado com expectativa razoável pelo público adulto, devido ao sucesso da tirinha no qual a história se baseia. Não é muito comum que os adultos demonstrem interesse por produções para crianças (exceção feita aos filmes da Pixar), e por isso a expectativa teve efeito inesperado, já que acabou gerando muitas críticas negativas. É fácil entender o fenômeno: os críticos esperavam uma produção mais ácida, com temática mais adulta, na mesma linha da tira de jornal, que aborda diariamente questões delicadas como aquecimento global e crescimento da população mundial. Ficaram decepcionados, pois “Os Sem-Floresta” é só um filminho leve e simpático feito para crianças.

De fato, o longa-metragem até começa ensaiando uma abordagem ousada sobre dois temas adultos, o extermínio das florestas e a perigosa massificação de comidas industrializadas na sociedade norte-americana. Em linhas gerais, a história usa esses dois fenômenos sócio-econômicos para construir o cenário em que a história vai se desenvolver: estamos na chegada da primavera, e os animais que começam a acordar da longa hibernação ficam chocados ao perceber que boa parte da floresta em que vivem foi derrubada, para a construção de um condomínio residencial. A diminuição da quantidade de comida disponível os obriga a ir buscar alimento nas ruas e casas, e todos passam a se empanturrar de batatas fritas, salgadinhos e pizzas.

No entanto, o filme jamais tenta aprofundar esta discussão, nem mesmo superficialmente. A trama do filme oferece um monte de ganchos para a discussão desses dois temas politicamente corretos, mas esses ganchos são convenientemente deixados de lado – afinal, seria pouco recomendável criticar a indústria de alimentos processados, que habitualmente assina contratos milionários com os estúdios para associar suas marcas a estas produções infantis. Não dá para imaginar que a McDonald’s, por exemplo, pudesse distribuir bonequinhos dos personagens nos lanches para crianças, caso os animais decidissem que comer hambúrgueres faz mal à saúde.

Desta forma, o longa-metragem prefere deixar de lado a chance de criticar os péssimos hábitos alimentares dos jovens dos EUA. Os animais da floresta ameaçada pela especulação imobiliária (assunto também deixado de lado após os 10 primeiros minutos) não vão buscar comida na cidade por falta de alimentos naturais no bosque. Eles são impelidos às ruas de concreto pelo guaxinim RJ, que está desesperado porque foi pego roubando o estoque de comida do urso Vincent, e este prometeu comê-lo se ele não repuser o estoque em uma semana.

Daí em diante, o filme se concentra na rivalidade entre o esperto guaxinim e a conservadora tartaruga Vernie, o líder dos animais, que não quer mudanças. Deixando de lado esse vacilo, contudo, a verdade é que “Os Sem-Floresta” tem bom potencial junto às crianças. O filme é curto, tem ação ágil, bons diálogos, e possui o tipo de humor ingênuo que funciona perfeitamente com os pequenos. Além disso, a animação é um tanto cartunesca (preste atenção nos personagens humanos), sem investir no extremo realismo que tem caracterizado as produções contemporâneas para crianças. Em resumo, trata-se de uma história simples e fácil de entender, que celebra valores universais como a amizade.

OK, os adultos podem se aborrecer ao pensar em ver uma animação infantil investir em temas tão batidos, mas é preciso lembrar que “Os Sem-Floresta” foi feito para os pequenos espectadores, uma turminha para quem esse raciocínio sobre originalidade não tem nenhuma importância, já que, como garotos, eles têm uma bagagem cinematográfica bastante reduzida. O importante é o seguinte: se tiver que assistir a “Os Sem-Floresta” acompanhando uma criança, pode ir sem medo, sabendo que vai encontrar um filme simpático e ágil. Só não espere que o longa da DreamWorks tenha potencial para encantar um adulto e transformá-lo momentaneamente em criança.

O lançamento em DVD, da Paramount, vem em disco simples e sem extras, com o filme em má qualidade: imagem cortada nas laterais (tela cheia, 4:3) e som Dolby Digital 5.1 (português e inglês).

– Os Sem-Floresta (Over the Hedge, EUA, 2006)
Direção: Tim Johnson e Karey Kirkpatrick
Animação (vozes de Bruce Willis e Nick Nolte)
Duração: 83 minutos

Um comentário em “Sem-Floresta, Os

Deixe um comentário